Filosofia da Educação- [3] Terceira etapa
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Professora Antonio- Realizado em 2014/2
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Por: Lino Carvalho - Face:Lino.Ufrj - Insta: @Linosfit - @UoLinosFit - CariocaLino
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CONTRIBUIÇÕES DA FILOSOFIA PARA A EDUCAÇÃO
Dermeval Saviani*
O tema deste artigo, tal corno formulado pelo Comitê Editorial do INEP,
"Contribuições das ciências humanas para a educação: a filosofia", já
pressupõe a definição da filosofia como ciência, bem como a sua inclusão
no âmbito das chamadas ciências humanas. Trata-se de um pressuposto,
no mínimo, discutível. A filosofia é ciência? Em caso de resposta afirmativa, que tipo de ciência seria a filosofia e qual o seu lugar no sistema
das ciências? -
Essas são questões suscitadas pelo enunciado do tema às quais, entretanto, não pretendemos responder neste artigo já que isto nos desviaria
do objetivo central contido no próprio enunciado que diz respeito às
possíveis contribuições da filosofia para a educação. O leitor interessado
nas referidas questões poderá lançar mão da obra de Kedrov, Clasificación de Ias Ciencias.
Na obra citada o autor passa em revista e submete à crítica as diversas
tentativas de classificação das ciências, das origens até o século XIX
(Tomo I), do final do século XIX até meados do século XX (Tomo II)
e examina a experiência da elaboração marxista atual de classificação
das ciências (Tomo III).
A pertinência do referido livro para a compreensão das questões levantadas pode ser aquilatada pela seguinte afirmação do autor: "Como dissemos reiteradas vezes, a estrutura geral da ciência, seu sistema e, por
fim, a classificação dos ramos que a formam dependem, em primeira
instância, do lugar que se concede neles à filosofia." 1
Nos limites de espaço deste texto entendemos que estaremos atendendo
adequadamente à proposta do INEP se, em lugar de discutir a filosofia
como um ramo das ciências humanas para, nessa condição, evidenciar
as suas contribuições para a educação, examinarmos diretamente as
contribuições da filosofia para a educação. Para tanto, procuraremos
identificar algumas dimensões da atividade filosófica explicitando suas
implicações no âmbito da educação.
Configuração do Objeto
Como se sabe, o objeto da filosofia não é predeterminado. Com efeito,
seu objeto é o próprio pensamento ou então a realidade em geral enquanto
suscetível, ou melhor, enquanto necessita ser pensada seja em si mesma,
na sua generalidade, seja nas suas manifestações particulares.
Dizer que o objeto da filosofia é o pensamento nos permite compreender
porque o assunto de que se ocupa a filosofia é de interesse de todos
os homens já que todos os homens pensam e, portanto, são, num certo
sentido, filósofos.
Conseqüentemente, o filósofo propriamente dito é um especialista do
pensamento, o que significa que ele "não só 'pensa' com maior rigor
lógico, com maior coerência, com maior espírito de sistema, do que os
outros homens, mas conhece toda a história do pensamento, isto é,
sabe quais as razões do desenvolvimento que o pensamento sofreu
até ele e está em condições de retomar os problemas a partir do ponto
onde eles se encontram após terem sofrido a mais alta tentativa de
solução, etc." 2
O mesmo não se pode dizer dos especialistas nos vários campos científicos, uma vez que "é possível imaginar um entomólogo especialista sem que todos os outros homens sejam 'entomólogos' empíricos...",3
quer dizer, o estudo dos insetos efetuados pelos entomólogos de modo
metódico e sistemático não constitui algo de que todos os demais homens
se ocupem, embora de forma espontânea e assistemática. Em contrapartida, o assunto de que se ocupa o filósofo é comum a todos os homens.
Por outro lado, dizer que realidade pode ser objeto da filosofia desde
que necessite ser pensada, coincide com a consideração de que o
objeto da filosofia é o problema entendido como algo que não se conhece
e que precisa ser conhecido, um,a dúvida que necessita ser dissipada,
uma dificuldade que precisa ser superada.4
Nas condições indicadas, a filosofia pode contribuir para uma melhor
configuração do objeto educativo à medida em que, problematizando-o,
o tema como tema de reflexão e, aplicando as exigências metodológicas
de radicalidade, rigor e globalidade, explicita suas características e diferencia-o dos fenômenos afins, pondo em evidência sua especificidade.
Assim, procedendo, a filosofia contribui para uma melhor delimitação
da educação enquanto objeto de conhecimento, viabilizando sua abordagem metódica e sistemática.
Aliás, este é o processo de surgimento e desenvolvimento das diferentes
ciências. Com efeito, em suas origens e conhecimento sistemático estava
todo ele englobado na filosofia. Progressivamente, sobre a base de desenvolvimento das condições objetivas consubstanciado no avanço das forças produtivas, com o surgimento da propriedade privada e a conseqüente
divisão do trabalho, a reflexão filosófica foi se aprofundando e explicitando
teoricamente a possibilidade concreta de delimitação do objeto, dando
origem às diversas ciências da natureza e da sociedade cujo desenvolvimento coloca, por sua vez, novos problemas que continuam a exigir
a contribuição da filosofia.
Determinação do Enfoque
Uma vez melhor caracterizado e delimitado o objeto, pode-se indagar
sobre a perspectiva de abordagem desse objeto. Tradicionalmente, a
abordagem metódica e sistemática da educação tem sido referida à pedagogia. Em que consiste a pedagogia? Que tipo de conhecimento a constitui? Trata-se de uma ciência ou é antes arte, técnica? Estando referida
ao fenômeno educativo a pedagogia sofre as vicissitudes que marcam
o seu objeto.
Considerando-se que a educação é um fenômeno complexo, ela implica
múltiplos aspectos que suscitam, por sua vez, múltiplas abordagens.
Assim é que a abordagem cientifica da educação se desdobra em vários
enfoques, a tal ponto que muitos estudiosos consideram que em lugar
de se falar em uma ciência da educação deve-se falar em ciências da
educação.
Efetivamente, entendendo-se a abordagem científica da educação como
sendo o conhecimento metódico e sistematizado da realidade educacional
obtido através da investigação e confirmado pela observação, raciocínio,
e experimentação, à primeira vista podem ser incluídas aí tanto a psicologia da educação, como a sociologia da educação, a biologia educacional, a economia da educação etc.
Por outro lado, considerando-se a arte de educar como a realização
original e criativa do ato educativo e a técnica de educar como a realização
do ato educativo através da aplicação correta e eficiente de regras predeterminadas. vê-se que enquanto a nota distintiva da arte é a originalidade.
a técnica se caracteriza predominantemente pela repetilividade. Qual
a relação entre esses diversos domínios de abordagens da educação?
E possível falar-se numa ciência técnica ou ciência prática como alguns
definem a pedagogia enquanto outros a consideram a ciência teórica
e prática da educação? E surge aqui o crucial problema das relações
entre teoria e prálica no âmbito educacional.
A questão apontada referente às relações entre teoria e prática pode
ser melhor entendida recorrendo-se a um exemplo. Sabe-se que os estudantes em geral e em especial os de Pedagogia tendem a contestar
a teoria em nome da prática. Como efeito, afirmam eles que o curso
que fazem é muito teórico e que deveria ser mais prático. Os professores,
por sua vez, tendem a responder a essa pressão dos alunos afirmando
que não apenas a prática mas também a teoria é importante; que os
alunos estão se revelando ativistas, mas mais tarde, quando estiverem
no exercício profissional, irão perceber a importância dos estudos que
estão fazendo, os quais agora-consideram muito teóricos.
O exemplo supra põe em evidência que teoria e prática, via de negra,
são consideradas como pólos opostos mutuamente excludentes. Tal consideração, contudo, decorre de conteúdos ambíguos e equívocos atribuídos
aos termos teoria e prática.
Com efeito, freqüentemente denomina-se teoria a um fenômeno cujo
conteúdo corresponde a "verbalismo", entendido aqui como o "gosto
da palavra oca".5 E é comum também aplicar-se a palavra "prática"a
algo cujo conteúdo deveria, antes, ser denominado de "ativismo". Ora,
o que exclui a prática é o verbalismo e não a teoria; e o que exclui
a teoria é o ativismo e não a prática. Entretanto, no exemplo em pauta,
os alunos acabavam defendendo um certo ativismo, em nome da prática,
contra o verbalismo que eles chamavam de teoria. E os professores,
de seu lado, terminavam por defender o próprio verbalismo, em nome
da teoria, contra a prática reivindicada pelos alunos mas que por eles
era reduzida ao ativismo.
Em suma, tendo em vista o problema de se determinar com maior precisão
o enfoque adequado à abordagem do fenômeno educativo, a filosofia
é chamada a contribuir através de uma reflexão radical, rigorosa e de
conjunto sobre as diferentes formas de se encarar a questão educacional,
explicitando as características de cada uma delas, suas diferenças e
semelhanças, bem como as relações recíprocas que se estabelecem
entre elas.
Redescoberta do Objeto
Em razão da complexidade acima referida, que suscita múltiplos enfoques
do fenômeno educativo, a consciência pedagógica acaba por descentrar-se de seu objeto, flutuando ao sabor das influências daqueles enfoques e aderindo precriticamente ora a um ora a outro conforme a predominância decorrente de determinadas circunstâncias.6
Assim é que, quando a influência da psicologia se torna predominante,
tende-se a configurar uma espécie de psicologismo pedagógico em que
o fenômeno educativo fica reduzido a seu aspecto psicológico desconsiderando-se ou subordinando-lhe os demais aspectos. Sobrevindo, porém,
uma outra influência ou apercebendo-se a consciência pedagógica de
que aquele enfoque não dá conta satisfatoriamente do fenômeno educativo, já que não realça suficientemente outros aspectos como, por exemplo, o caráter social da educação, a referida consciência pedagógica
passa a aderir, também precriticamente, ao enfoque da sociologia da
educação, operando agora um novo reducionismo caracterizado pelo
sociologismo pedagógico. Diante de novas influências ocorrerão novas
flutuações agravando o fenômeno de afastamento da consciência pedagógica em relação a seu objeto.
Para superar essas flutuações e propiciar à consciência pedagógica a
redescoberta de seu objeto, faz-se necessária, uma vez mais, a intervenção da filosofia. Com efeito, a reflexão filosófica permitirá compreender
que, ao aderir às diferentes influências, os pedagogos não se dão conta
de que estão deslocando o eixo de preocupação da educação para a
psicologia ou a sociologia, etc, perdendo de vista seu objeto específico.
Em outros termos, nos enfoques referidos, o ponto de partida e o ponto
de chegada é a psicologia ou a sociologia, etc, reduzindo-se a educação
a um mero ponto de passagem. Cumpre restabelecer o primado do problema recolocando a educação no centro de nossas cogitações, isto é,
como ponto de partida e ponto de chegada das teorizações e práticas
pedagógicas.
A situação mencionada pode ser visualizada através de dois gráficos
que construímos para um outro estudo:7
O gráfico "A" corresponde ao fenômeno das flutuações da consciência
pedagógica. Al a educação é um mero ponto de passagem; está pois
descentrada. O ponto de partida e o ponto de chegada estão fora dela.
Isto significa que as pesquisas no âmbito da sociologia da educação
(e isto vale também para as demais áreas) circunscrevem a educação
como seu objeto, encarando-a como fato sociológico que é visto, conseqüentemente, à luz das teorizações sociológicas a partir de cuja estrutura
conceptual são mobilizadas as hipóteses explicativas do aludido fato.
O processo educativo é encarado, pois, como campo de testes das hipóteses que, uma vez verificadas, redundarão no enriquecimento do acervo
teórico da disciplina sociológica referida.
O gráfico "B" representa a inversão do circuito. A educação, enquanto
ponto de partida e de chegada, torna-se o centro das preocupações.
Note-se que ocorre agora uma profunda mudança de projeto. Ao invés
de se considerar a educação a partir de critérios psicológicos, sociológicos. econômicos etc, são as contribuições das diferentes áreas que
serão avaliadas a partir da problemática educacional. O processo educativo erige-se, assim, em critério, o que significa dizer que a incorporação desse ou daquele aspecto do acervo teórico que compõe o conhecimento
científico em geral dependerá da natureza dos problemas enfrentados
pelos educadores".
Com a mudança de rota sugerida, o educador não estará impedido de
aderir às teorizações ou mesmo as práticas provenientes das diferentes
disciplinas que abordam o fenômeno educativo. Entretanto, a adesão
não será mais precrítica. Trata-se, agora, de uma adesão crítica, isto
é, submetida ao crivo das exigências da problemática educativa.
Orlandi (1969), no texto já citado, fornece um exemplo interessante para
ilustrar o que foi dito. Refere-se ele à diferença entre as posições do
leigo e do médico diante das sugestões contidas na bula de determinado
medicamento. O leigo adere precriticamente à sugestão da bula. Assim,
se lá está escrito "tomar três comprimidos ao dia", o leigo irá considerá-lo
ao pé da letra já que não dispõe de critério para avaliar o alcance daquela
sugestão em relação à situação do paciente. Já o médico poderá acatar
a sugestão da bula, mas tenderá a fazê-lo de modo crítico, isto é, submetendo-a ao crivo da situação do paciente. Assim, se a situação do paciente for muito grave, ele poderá ampliar a sugestão da bula ao passo
que se a referida situação não se revestir de maior gravidade, ele poderá
reduzir a dose ministrando, por exemplo, apenas um ou dois compridos
ao dia.
Analogamente ao exemplo mencionado, os educadores levarão ou não
em conta as contribuições das várias áreas, na medida e na proporção
da necessidade decorrente do exame da problemática educacional enquanto tal, incorporando apenas aqueles elementos que concorram
para o equacionamento da referida problemática.
Através desse processo reflexivo que permite precisar o objeto próprio
da educação distinguindo-o dos objetos específicos das disciplinas afins
as quais também incidem, a seu modo, sobre determinados aspectos
que têm a ver com a questão educacional, pode-se aclarar também o enfoque próprio da educação. Com isto abre-se caminho para se precisar o sentido da pedagogia e o caráter de uma ciência da educação
distinta das ciências afins que têm sido correntemente catalogadas no
rol das chamadas ciências da educação.
Vigilância Crítica
Considerando-se, ainda, que a educação é uma atividade prática, cumpre
não apenas compreender as suas características, mas, também, as condições, tanto externas como internas, em que ó desenvolvida.
Por condições externas entendem-se as determinações econômicas e
sociais assim como as determinações decorrentes da política em geral
e especialmente da política econômica e da política educacional.
Por condições internas entendem-se a situação material e cultural das
escolas, a organização do trabalho pedagógico, a adequação entre meios
e fins, processos e resultados, a coerência entre o proposto e o realizado,
a qualidade dos conteúdos e dos métodos etc.
Enquanto atividade especificamente humana, a educação se caracteriza
pela intencionalidade, isto é, pela antecipação mental de seus resultados
na forma de objetivos a serem alcançados. É mister, pois, que no curso
da ação se mantenham continuamente presentes os objetivos que são
a razão de ser mesma da atividade que está sendo realizada. Sem
isto a prática degenera em burocratismo o qual consiste na aplicação
mecânica, a um novo processo, de formas extraídas de um processo
anterior do qual foram autonomizadas, passando a justificar-se por si
mesmas.
A atividade educacional, pela sua complexidade e pelo peso da rotina
pedagógica, é particularmente vulnerável a esse tipo de desvio. Para
evitá-lo é indispensável a vigilância da reflexão. E a forma por excelência
da atividade reflexiva chama-se filosofia. Eis por que se pode considerar
como uma das funções precípuas da filosofia da educação "acompanhar
reflexiva e criticamente a atividade educacional de modo a explicitar
os seus fundamentos, esclarecer a tarefa e a contribuição das diversas
disciplinas pedagógicas e avaliar o significado das soluções escolhidas". 10
Acesso aos Clássicos
Até aqui enfatizamos a filosofia enquanto atitude reflexiva destinada a
elucidar os problemas com que o homem se defronta no transcurso
de sua existência.
Entretanto, é preciso considerar que a própria determinação dos proble
mas põe em evidência que não se reflete simplesmente pelo puro gosto
de refletir, isto é, não se desencadeia o processo reflexivo para não
se chegar a lugar algum. Em verdade, o processo de reflexão conduz
a determinados resultados que se consubstanciam em concepções de
mundo. Por isso a filosofia é também entendida como concepção de
mundo que se expressa em seu nível mais elaborado, logicamente consistente e coerente.
A filosofia, enquanto concepção de mundo, formula e encaminha a solução dos grandes problemas postos pela época que ela se constitui. Como
tal, ela contém em si, de forma sintética e conceptualizada, a problemática
da época. Por isso, os filósofos que a História reconhece como tais,
são, via de regra, os grandes intelectuais que conseguiram expressar
de forma mais elaborada os problemas das respectivas fases de desenvolvimento da humanidade. Nesse sentido, se tornaram clássicos, isto é,
integram o patrimônio cultural da humanidade já que suas formulações
embora radicadas numa época determinada, extrapolam os limites dessa
época, mantendo o seu interesse mesmo para as épocas ulteriores.
A filosofia, enquanto concepção de mundo, formula e encaminha a solução dos grandes problemas postos pela época que ela se constitui. Como
tal, ela contém em si, de forma sintética e conceptualizada, a problemática
da época. Por isso, os filósofos que a História reconhece como tais,
são, via de regra, os grandes intelectuais que conseguiram expressar
de forma mais elaborada os problemas das respectivas fases de desenvolvimento da humanidade. Nesse sentido, se tornaram clássicos, isto é,
integram o patrimônio cultural da humanidade já que suas formulações
embora radicadas numa época determinada, extrapolam os limites dessa
época, mantendo o seu interesse mesmo para as épocas ulteriores.
No sentido referido, o estudo crítico dos grandes filósofos, isto é, dos
clássicos da filosofia, é uma via de acesso privilegiada à compreensão
da problemática humana o que tem grande valor educativo, já que a educação não é outra coisa senão o processo através do qual se constitui
em cada indivíduo a universalidade própria da espécie humana.
Deve-se frisar, no entanto, que se trata de estudo crítico já que está
é condição indispensável da efetiva compreensão da realidade humana,
pois o que está em causa não é uma suposta idealização ingênua da
filosofia e do filósofo, mas o exato entendimento do seu significado histórico, o que implica a sua crítica.
Com efeito, as filosofias, ao refletirem os problemas de sua época, refletem também as suas contradições. Em conseqüência, o estudo crítico irá
reconhecer os conflitos e as lutas entre diferentes concepções filosóficas
no interior de uma época e ao longo do desenvolvimento da história
da humanidade.
Concepções de Filosofia da Educação
Quando a reflexão filosófica se volta deliberada, metódica e sistematicamente para a questão educacional, explicitando os seus fundamentos
e elaborando as suas diversas dimensões num todo articulado, a concepção de mundo se manifesta, aí, na forma de uma concepção filosófica
de educação. Considerando que as diversas concepções de filosofia
da educação constituem diferentes maneiras de articular os pressupostos
filosóficos com a teoria da educação e a prática pedagógica, o estudo
crítico dessas concepções constitui um componente essencial da formação do educador.
Com efeito, através desse estudo o educador irá compreender com maior
clareza a razão da existência de teorias da educação contrastantes
e de práticas pedagógicas que se contrapõem. E, contrariamente à opinião corrente que tende a autonomizar a prática da teoria e vice-versa,
entenderá que a prática pedagógica é sempre tributária de determinada
teoria que, por sua vez, pressupõe determinada concepção filosófica
ainda que em grande parte dos casos essa relação não esteja explicitada.
Ora, quando os pressupostos teóricos e os fundamentos filosóficos da prática ficam implícitos, isto significa que o educador, via de regra, está
se guiando por uma concepção que se situa ao nível do senso comum.
Entende-se por senso comum uma concepção não elaborada, constituída
por aspectos heterogêneos de diferentes concepções filosóficas e por
elementos sedimentados pela tradição e acolhidos sem crítica. Em conseqüência, a prática orientada pelo senso comum tende a se caracterizar
pela inconsistência e incoerência.
Para imprimir maior coerência e consistência à sua ação. é mister que
o educador se eleve do senso comum ao nível da consciência filosófica
de sua própria prática, o que implica detectar e elaborar o bom senso
que é o núcleo válido de sua atividade. E tal elaboração passa pelo
confronto entre as experiências pedagógicas significativas vividas pelo
educador e as concepções sistematizadas da filosofia da educação. Com
isso será possível explicitar os fundamentos de sua prática e superar
suas inconsistências, de modo a torná-la coerente e eficaz.
Clareza Conceituai e Terminológica
Atingindo uma compreensão mais profunda, mais rigorosa e mais ampla
de seu objeto, o educador irá depurando seu pensamento e sua linguagem
de eventuais ambigüidades e imprecisões.
Essa função da filosofia tem sido especialmente enfatizada pela concepção analítica, a qual entende que o papel próprio da filosofia é a análise
lógica da linguagem. Em conseqüência, o papel da filosofia da educação
passa a se efetuar a análise lógica da linguagem educacional de modo
a libertá-la de suas imprecisões e incongruências. Entretanto, independentemente da concepção que o inspira ou na qual desemboca, o aprofundamento filosófico implica necessariamente o rigor lógico-conceitual. o
qual só pode se manifestar através de uma linguagem precisa, clara
e inteligível.
Essa é uma outra contribuição da filosofia para a educação. Possibilitando
uma maior clareza conceituai e de linguagem, melhora-se a comunicação
entre os educadores e destes com os que cultivam as demais áreas do conhecimento, situando a pedagogia no rumo da maturidade epistemológica que lhe garanta condições de igualdade em face dos demais ramos
do saber científico.
Conclusão
Apontamos algumas contribuições da filosofia para a educação sem entrar
no mérito do caráter que tais contribuições assumem conforme se adote
esta ou aquela perspectiva filosófica. Obviamente que, variando a concepção de filosofia da educação, variarão também as soluções das questões
educacionais levantadas neste texto. Assim, por exemplo, a configuração
do objeto da educação será uma se enfocado sob o prisma da concepção
humanista tradicional da filosofia da educação e será outra, caso se
adote a perspectiva da concepção humanista moderna ou analítica ou
critico-reprodutivista ou histórico-crítica (dialética).
Abstivemo-nos. porem, de enveredar pela análise desses diferentes pontos de vista sob os quais a contribuição da filosofia para a educação
pode ser considerada.
Esse procedimento se justifica uma vez que em nosso entendimento cabe à seção "enfoque" abordar as principais dimensões do tema em
exame, deixando "em aberto" as diferentes perspectivas da abordagem
as quais poderão ser objeto de explicitação na seção "pontos de vista".
Bibliografia
FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro,
Paz e Terra, 1967.
GRAMSCI, Antonio Concepção dialética da história. 2 ed. Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 1978.
KEDROV, B M. Clasificación de Ias ciências. Moscou, Progresso,
1976. Tomo II.
ORLANDI, L. B. L. O problema da pesquisa em educação e algumas
de suas implicações. Educação Hoje, mar. abr., 1969.
SÁNCHEZ VÁZQUEZ, A. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1968
SAVIANI. Dermeval Educação: do senso comum à consciência filosófica. São Paulo, Autores Associados'Corlez, 1980

